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escrevo a dor e o prazer de viver vivo para escapar da morte morro e acordo cada vez mais forte

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Quatro dias

Queridos e queridas,

Eu tenho tantos assuntos para resolver que nem as noites insones tem sido suficientes para dar conta. Porque não é só uma questão de tempo, mas de ter energia e disposição para fazer tudo direito. Cansada, o risco de errar aumenta. Para descansar, a melhor terapia: ver um filme. Ver O filme. Optei hoje por um clássico no gênero drama e romance, de e com um diretor e ator que não erra nunca, nem insone, nem cansado, nem quanto mais o tempo e a idade passam: Clint Eastwood.
Eu já vi vários filmes dirigidos e produzidos por ele, ou com ele atuando. Em vários gêneros. Embora ele tenha ficado mais conhecido no início de sua carreira pelo jeito durão, seja nos filmes western ou como Dirty Harry, ou ainda pelo seu charme e por uma sensualidade viril, Clint Eastwood é um grande cineasta, tem uma sensibilidade que o distingue e nos faz esperar sempre um filme melhor do que o outro, é o mínimo que se espera dele. Sobre Meninos e Lobos (2003) e Menina de Ouro (2004) são exemplares. Por coincidência (?) estava passando hoje na tv o filme Os imperdoáveis, com Clint em grande forma e estilo. Mas eu preferi ver As pontes de Madison (1995). Por que? Simplesmente porque esse é um dos melhores filmes que eu já vi.
As Pontes de Madison (Bridges of Madison County) é um filme baseado no romance de Robert James Waller, com roteiro de Richard La Gravenese. Dois irmãos se reecontram após a morte de sua mãe (Meryl Streep). Eles descobrem, nas cartas que ela lhes escreveu, o romance que ela teve durante quatro dias com um fotógrafo (Clint Eastwood), enquanto seu marido e filhos haviam viajado. Essa descoberta, que incialmente causa uma certa revolta e perplexidade, vai levando-os a uma nova descoberta, de conhecerem sua mãe, suas motivações, suas renúncias e suas escolhas, o que vai fazê-los repensar sobre seus próprios relacionamentos.
Este filme é de um cuidado impressionante, com diálogos lapidados, com prenúncios de cenas que não vão nos deixar intactos. Não há como não se deixar envolver com o envolvimento que passa a acontecer entre os protagonistas. É como o destino. Não o programamos, mas ele acontece. Não o chamamos, mas ele vem. Como um dia após o outro. Em quatro dias ela ficaria sozinha. Em quatro dias ela viveu sua maior e mais profunda paixão, sua verdadeira história de amor. Em quatro dias ela viveu o paraíso do jogo de sedução, da descoberta de um erotismo que já nem lembrava existir, de conhecer-se como uma outra mulher que na verdade era ela mesma. Ela viveu, nesses quatro dias, o inferno de saber que um dia tudo terminaria, que de seu sonho acordaria, porque competia a ela, e somente a ela, escolher, entre ficar ou partir. Deixar uma vida e partir para outra vida. Satisfazer seu desejo e carregar sua culpa. Em quatro dias, foi feliz e foi infeliz, foi desejada e desejou ardentemente, foi amada e amou como nunca, foi decidida e confusa, atravessou pontes que nunca havia imaginado atravessar.
Quando o final do filme se aproxima, percebemos qual será sua escolha. Amor e família às vezes são questões de múltipla escolha. Quando ele fala para ela que não poderá espremer toda sua vida em quatro dias, ele resume tudo, todo o sentido do filme. A sincronicidade está ali. Um chegou até o outro porque tinham que ter chegado. Porque de alguma forma teriam que ter se conhecido. O problema é o que fazer a partir do encontro. Encontro de almas? De corpos? De momentos? De escolhas? Apenas um encontro. Em quatro dias. Que valeu por toda a vida.

O filme é belo. O filme é triste. Quando terminei de ver, vim para cá escrever. Termino lembrando de um poema, um hai-kai, que eu escrevi há muito tempo, que me ocorre agora, ao relacionar com esse filme: Não viola minha morada. Dá-lhe vida. E, depois, vai embora.
Desencontro de corpos. Permanência de almas. Bom é saber que nas pontes há sempre dois lados. A ida e a volta. Esse é o mistério da vida: o destino, e a sincronicidade. Mesmo que seja por quatro, três, dois, ou um dia. Abraços!

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